Entrevista
especial comengenheira agrônoma Flávia Londres, consultora da
Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa – AS-PTA.
O
elevado e “alarmante consumo” de agrotóxicos no Brasil é resultado “de um
conjunto de opções políticas adotadas pelo país, que remonta aos anos 1960”, esclarece Flávia
Londres, autora do livro lançado na semana passada, Agrotóxicos
no Brasil – um guia para ação em defesa da vida. Segundo ela, há 50 anos o
Brasil potencializou investimentos em um modelo agrícola de monocultura que
incentiva o uso de agrotóxicos nas plantações.
As
isenções fiscais e tributárias também têm favorecido a comercialização do
produto no país e fazem parte da política expansionista do agronegócio. “O
governo federal concede redução de 60% da alíquota de cobrança do ICMS a todos
os agrotóxicos e isenta completamente de IPI, PIS/Pasep e Cofins os agrotóxicos
fabricados a partir de uma lista de dezenas de ingredientes ativos (incluindo
alguns altamente perigosos como o metamidofós e o endossulfam, que recentemente
tiveram o banimento determinado pela Anvisa)”, informa a engenheira agrônoma em
entrevista concedida por e-mail.
Em
função das lavouras transgênicas, Flávia menciona que cresce no Brasil a
comercialização de agrotóxicos. “Segundo estimativas da indústria de
biotecnologia, mais de 75% das lavouras transgênicas cultivadas no Brasil são
de soja transgênica da Monsanto tolerante ao Roundup (herbicida à base de
glifosato). Não por acaso, o consumo de glifosato no Brasil saltou de 57,6 mil
para 300 mil toneladas entre 2003 (ano da autorização da soja transgênica no
país) e 2009, segundo dados divulgados pela Anvisa”, menciona.
Flávia Londres é formada em Engenharia Agrônoma pela Universidade de São Paulo – USP e atualmente é consultora da Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa – AS-PTA.
Flávia Londres é formada em Engenharia Agrônoma pela Universidade de São Paulo – USP e atualmente é consultora da Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa – AS-PTA.
Confira
a entrevista.
IHU On-Line – A que atribui a aceleração
do uso de agrotóxicos no Brasil? Por que o país começou a investir nesses
produtos?
Flavia Londres – O alarmante nível de consumo
de agrotóxicos que alcançamos nos últimos anos (o Brasil conquistou a liderança
mundial em 2008 e desde então os volumes usados continuam aumentando) é
resultado de um conjunto de opções políticas adotadas pelo país, que remonta
aos anos 1960 – época em que o modelo de agricultura hoje dominante, das
grandes monoculturas baseadas no uso de sementes melhoradas, forte mecanização,
adubação química e agrotóxicos, começou a ser difundido com grandes incentivos.
A partir de então, a pesquisa, o ensino, o crédito e a assistência técnica
oficial voltaram-se para a promoção deste tipo de agricultura.
Teve
papel central neste processo a criação, em 1965, do Sistema Nacional de Crédito
Rural, que vinculava a obtenção de crédito agrícola à obrigatoriedade da compra
de insumos químicos pelos agricultores. Outro elemento-chave foi a criação, em
1975, do Programa Nacional de Defensivos Agrícolas, no âmbito do II Plano
Nacional de Desenvolvimento – PND, que proporcionou recursos financeiros para a
criação de empresas nacionais e a instalação no país de subsidiárias de
empresas transnacionais de insumos agrícolas.
Outro
elemento de destaque a ser mencionado são as isenções fiscais e tributárias
concedidas, até hoje, ao comércio de agrotóxicos. O governo federal concede
redução de 60% da alíquota de cobrança do ICMS a todos os agrotóxicos e isenta
completamente de IPI, PIS/Pasep e Cofins os agrotóxicos fabricados a partir de
uma lista de dezenas de ingredientes ativos (incluindo alguns altamente
perigosos como o metamidofós e o endossulfam, que recentemente tiveram o
banimento determinado pela Anvisa). Além das isenções federais, há as isenções
complementares determinadas pelos estados – na maior parte dos casos a isenção
de impostos para atividades envolvendo agrotóxicos chega a 100%.
Mais
recentemente, a difusão das lavouras transgênicas no país também contribuiu
decisivamente para o crescimento deste mercado. A soja transgênica tolerante à
aplicação do herbicida (mata-mato) glifosato representa mais da metade de todos
os transgênicos plantados no mundo. Segundo estimativas da indústria de
biotecnologia, mais de 75% das lavouras transgênicas cultivadas no Brasil são
de soja transgênica da Monsanto tolerante ao Roundup (herbicida à base de
glifosato). Não por acaso, o consumo de glifosato no Brasil saltou de 57,6 mil
para 300 mil toneladas entre 2003 (ano da autorização da soja transgênica no
país) e 2009, segundo dados divulgados pela Anvisa.
Outra
informação que chama a atenção é o aumento recente da importação de agrotóxicos
de países como a China. Em alguns casos, a proibição de certos ingredientes
ativos em outros países levou ao aumento da sua importação pelo Brasil. É o
caso do metamidofós, cuja importação mais que dobrou depois que o produto foi
proibido na China, em 2008. Ou seja, viramos mercado consumidor para produtos
perigosos banidos em outros países.
Por
fim, acredito que também tenha papel relevante no uso abusivo de venenos a
ineficiência da fiscalização pelos órgãos oficiais. A legislação brasileira
determina uma série de restrições e limites ao uso dessas substâncias, mas na
prática não acontece qualquer tipo de controle.
IHU On-Line – Que avaliação faz da
legislação brasileira sobre agrotóxicos? Quais são os principais desafios da
legislação em relação à segurança do produto?
Flavia Londres – A legislação brasileira
sobre agrotóxicos não é ruim. Se fosse cumprida por todos os elos da cadeia
(fabricantes, comerciantes, órgãos de fiscalização e agricultores), os danos
provocados pelos venenos agrícolas seriam consideravelmente menores.
Para começar, a legislação proíbe o registro de produtos que revelem características teratogênicas (ou seja, que provoquem malformação fetal), carcinogênicas (que provoquem câncer) ou mutagênicas (que provoquem mutações genéticas), que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor ou mesmo danos ao meio ambiente. A questão é que em grande parte das vezes não é simples comprovar a existência desses efeitos. É muito comum que os danos provocados pelos agrotóxicos não sejam evidenciados na fase de testes e apenas venham a ser conhecidos após sua introdução no meio ambiente e no contato com as pessoas.
Para começar, a legislação proíbe o registro de produtos que revelem características teratogênicas (ou seja, que provoquem malformação fetal), carcinogênicas (que provoquem câncer) ou mutagênicas (que provoquem mutações genéticas), que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor ou mesmo danos ao meio ambiente. A questão é que em grande parte das vezes não é simples comprovar a existência desses efeitos. É muito comum que os danos provocados pelos agrotóxicos não sejam evidenciados na fase de testes e apenas venham a ser conhecidos após sua introdução no meio ambiente e no contato com as pessoas.
Daí
a importância da Reavaliação da segurança ambiental e à saúde de produtos
agrotóxicos, que deve ocorrer sempre que uma alteração no nível de risco de um
produto é verificada. As alterações de riscos à saúde, por exemplo, podem advir
do avanço dos conhecimentos científicos sobre os produtos, de alertas
provocados por observações epidemiológicas, de casos de intoxicação
notificados, entre outras possibilidades. Até mesmo o fato de outros países
terem proibido um determinado agrotóxico representa uma alteração do nível de
risco. E esta reavaliação pode, entre outras medidas, levar ao cancelamento do
registro.
Mas
o que tem acontecido na prática é que os órgãos têm enfrentado muitas
dificuldades para conduzir as reavaliações. Em 2008, a Anvisa publicou uma
lista de 14 agrotóxicos a serem reavaliados. Mas no mesmo ano o trabalho de
reavaliação toxicológica foi marcado por longa batalha judicial contra
liminares favoráveis às empresas, que tentaram impedir na Justiça a Anvisa de
conduzir os estudos. Em alguns casos, o Ministério da Agricultura associou-se
às empresas de agrotóxicos tentando impedir a Anvisa de realizar seu trabalho.
Os estudos somente foram retomados após vários meses.
De
lá para cá, a Anvisa concluiu a reavaliação de 5 daqueles 14 agrotóxicos,
determinando a proibição (imediata ou programada) de 4. Mas, supreendentemente,
a história nem sempre acaba aí. O caso do metamidofós é um exemplo: o fim da
sua comercialização está programado para dezembro de 2011. Com a proximidade da
data, um dos fabricantes do veneno conseguiu uma nova liminar, em junho último,
permitindo a continuidade da fabricação e da venda do produto. Somente em 5 de
setembro o Tribunal Regional Federal – TRF de Brasília suspendeu a liminar e
voltou a vigorar a decisão da Anvisa pela proibição.
Há
ainda outros mecanismos importantes previstos na legislação – não só na lei
federal, mas também em diversas leis estaduais. Há estados, por exemplo, que
determinam a proibição de agrotóxicos que já tenham sido banidos em seus países
de origem, em outros a lei determina que as secretarias de meio ambiente, saúde
e/ou agricultura conduzam, de forma permanente, o monitoramento da presença de
resíduos de agrotóxicos no ar, na água, no solo e em alimentos. Infelizmente,
entretanto, nada disso é cumprido. Em suma, o maior desafio neste campo é o
próprio cumprimento da legislação que já existe.
IHU On-Line – Por que agrotóxicos proibidos
em outros países são permitidos no Brasil?
Flavia Londres – Justamente pelas
dificuldades em se conduzir e concluir as reavaliações toxicológicas. Além das
batalhas judiciais, há também as pressões políticas sofridas pela equipe
técnica da Anvisa, vindo não só das empresas fabricantes dos produtos em
reavaliação, mas também de parlamentares ligados ao agronegócio, por exemplo.
Além
disso, embora a Anvisa seja soberana quanto ao resultado de uma reavaliação
toxicológica, a decisão da retirada de um ingrediente ativo do mercado é tomada
por um Comitê do qual também participam o Ministério da Agricultura e o Ibama.
E, via de regra, o Ministério da Agricultura se opõe ao banimento dos produtos,
alegando prejuízos econômicos para os agricultores. É para acomodar esse tipo
de problema que em alguns casos são determinados os chamados “banimentos
faseados”, em que se estabelecem prazos, por vezes de até dois anos, para que o
uso do produto seja descontinuado e finalmente cessado.
IHU On-Line – Quais as implicações do uso
de agrotóxico na agricultura? É possível vislumbrar uma agricultura sem o uso
de agrotóxico? Qual seria a alternativa?
Flavia Londres – Não há possibilidade de uso
de agrotóxicos sem a contaminação do meio no qual a lavoura se encontra. Estimativas
da Embrapa, por exemplo, indicam que, mesmo quando todas as regras de aplicação
são cumpridas, em média apenas metade do que é pulverizado atinge o alvo (no
caso, as plantas a serem “tratadas”). O resto escorre para o solo, comumente
contaminando águas subterrâneas, ou segue pelos ares para contaminar outras
áreas.
Além
disso, a ideia do chamado “uso seguro”, segundo a qual o uso de equipamentos de
proteção e a observação das recomendações técnicas evitariam os casos de
intoxicação dos trabalhadores rurais, mostra-se, na prática, absolutamente
impossível – seja pela dificuldade de se seguir no campo todas as recomendações
de segurança, seja pela própria incapacidade destes métodos de fornecer real
segurança.
E,
contrariando a tese de que dependeríamos dos agrotóxicos para alimentar uma
população crescente, existem infinitas experiências que mostram ser possível
alcançar boas produtividades a baixíssimo custo através de sistemas ecológicos
de produção. Trata-se de sistemas diversificados, de baixo impacto ambiental,
capazes de produzir alimentos saudáveis e contribuir para a promoção da
segurança alimentar e nutricional.
Esses
sistemas não se aplicam ao modelo do agronegócio: é evidente que em vastas
extensões de monoculturas, nas quais se eliminam completamente os elementos da
paisagem natural, reduz-se a biodiversidade ao extremo e exaure-se o solo,
torna-se impossível produzir de maneira sustentável.
Os
sistemas agroecológicos, ao contrário, são adaptados à realidade da agricultura
familiar e reforçam a proposta de outro modelo de desenvolvimento para o campo,
que prevê a repartição das terras e a produção descentralizada, que possa
empregar muita mão-de-obra, dinamizar economias e abastecer mercados locais com
alimentos saudáveis.
IHU On-Line – Quais são principais
irregularidades cometidas pelos agricultores ao utilizar agrotóxicos?
Flavia Londres – Não há, na prática, um
controle eficaz sobre o uso de agrotóxicos. Há, por outro lado, muita carência
de assistência técnica e informação por parte dos agricultores. Muito comumente
quem faz a recomendação de que produtos aplicar e em que dosagens se deve
fazê-lo são os vendedores das casas agropecuárias. Consequentemente, é comum
frequente o uso de agrotóxicos não autorizados para as culturas tratadas, o uso
de dosagens acima do permitido e o não cumprimento dos períodos de carência
(intervalo de tempo exigido entre a última aplicação e a comercialização do
produto). Há atualmente também muitos produtos sendo contrabandeados para o
país – alguns, inclusive, já proibidos ou que nunca foram autorizados no
Brasil. Tudo isso leva os produtos que consumimos a apresentarem níveis de
resíduos considerados prejudiciais à saúde.
A
pulverização aérea é outro grave exemplo. A legislação determina distâncias
mínimas de aplicação em relação áreas residenciais e cursos d’água, bem como a
observação das condições meteorológicas, buscando minimizar a deriva do veneno
para áreas vizinhas à lavoura. Mas nada disso é cumprido.
A
destinação inadequada de embalagens vazias é outro grave problema. Embora a
construção e o gerenciamento dos postos e centrais de recolhimento de
embalagens sejam uma obrigação para os fabricantes de venenos, ainda são poucos
os lugares que contam com este tipo de estrutura. Em alguns casos, a instalação
só foi possível a partir da mobilização da sociedade e intervenção do
Ministério Público. Muito comumente as embalagens são abandonadas ao relento ou
descartadas no lixo comum, liberando resíduos tóxicos que contaminam o solo e a
água.
Também
o uso de equipamentos de proteção pelos aplicadores das caldas tóxicas, exigido
pela legislação, é coisa rara de se ver no campo.
IHU On-Line – Como o cidadão pode
identificar e notificar casos de intoxicação alimentar gerada por alimentos com
agrotóxicos?
Flavia Londres – Há basicamente três tipos de
intoxicação. A intoxicação aguda é aquela cujos sintomas surgem rapidamente,
algumas horas após a exposição ao veneno. Normalmente, trata-se de exposição,
por curto período, a doses elevadas de produtos muito tóxicos. Os efeitos podem
incluir dores de cabeça, náuseas, vômitos, dificuldade respiratória, fraqueza,
salivação, cólicas abdominais, tremores, confusão mental, convulsões, entre
outros. Ela pode ocorrer de forma leve, moderada ou grave, dependendo da
quantidade de veneno absorvida, e em muitos casos pode levar à morte.
A
intoxicação subaguda ou sobreaguda ocorre por exposição moderada ou pequena a
produtos alta ou medianamente tóxicos. Os efeitos podem aparecer em alguns dias
ou semanas. Os sintomas podem incluir dores de cabeça, fraqueza, mal-estar, dor
de estômago, sonolência, entre outros.
E
a intoxicação crônica caracteriza-se pelo surgimento tardio: aparecem apenas
após meses ou anos da exposição pequena ou moderada a um ou vários produtos
tóxicos. Os sintomas são normalmente subjetivos e podem incluir perda de peso,
fraqueza muscular, depressão, irritabilidade, insônia, anemia, dermatites,
alteração hormonal, problemas imunológicos, efeitos na reprodução
(infertilidade, malformações congênitas, abortos), doenças do fígado e dos
rins, doenças respiratórias, efeitos no desenvolvimento da criança, entre
outros.
A
intoxicação provocada pelo consumo de alimentos com altos níveis de resíduos de
agrotóxicos é aquela do tipo crônico e, nestes casos, é muito difícil comprovar
a relação da doença desenvolvida com a exposição a agrotóxicos através da
alimentação ao longo da vida – sobretudo porque é praticamente impossível aos
consumidores relatar a que tipos de agrotóxicos estiveram expostos através da
ingestão de produtos contaminados. É importante, de todo modo, que o paciente,
ou seus parentes, colegas de trabalho etc., relatem ao profissional de saúde
todas as informações necessárias a uma avaliação completa sobre o contexto em
que a doença se desenvolveu e qualquer possibilidade de relação entre a doença
desenvolvida e a exposição algum tipo de veneno agrícola.
Quanto
à notificação, ela deve ser feita pelo profissional de saúde que fizer o
atendimento à pessoa intoxicada. Os dois principais sistemas de registro e
notificação de intoxicações por agrotóxicos são o Sistema Nacional de
Informações Tóxico Farmacológicas – Sinitox, gerenciado pela Fiocruz, e o
Sistema de Informação de Agravos de Notificação – Sinan, gerenciado pelo
Ministério da Saúde.
Para
os casos de intoxicação aguda, existe um serviço chamado Disque Intoxicação:
0800-722-6001. Ele é gerenciado pela – Rede Nacional de Centros de Informação e
Assistência Toxicológica – Renaciat . Quem atende é um profissional treinado
para dar orientações em casos de intoxicações ou acidentes com agrotóxicos,
animais peçonhentos, produtos saneantes e medicamentos. O serviço funciona 24
horas por dia, todos os dias do ano. A ligação é gratuita e os dados relatados
viram notificações dos casos de intoxicação.
IHU On-Line – O que acha do eufemismo de
chamar agrotóxico de defensivo agrícola?
Flavia Londres – A chamada Lei dos
Agrotóxicos (Lei 7.802/1989) traz, em seu Art. 2º, a definição dos “Agrotóxicos
e afins”. Este é o termo técnico adotado pela legislação para designar os
venenos agrícolas.
Entretanto,
os promotores do seu uso, fabricantes de venenos e lideranças do agronegócio,
insistem em chamá-los de “defensivos agrícolas” – uma expressão mais suave, que
omite os riscos associados a estes produtos. Muitos jornalistas acabam também
adotando esta terminologia acreditando estarem usando uma linguagem mais
técnica.
Acho
importante insistirmos no uso da denominação oficial, “agrotóxicos”, pois ela
cumpre o papel de revelar que se trata de produtos perigosos, que implicam em
risco para quem os manipula.
IHU On-Line – Ainda há muita dificuldade
de se discutir o uso de agrotóxicos no Brasil? Por quê?
Flavia Londres – Este tema vem ganhando
evidência no Brasil a partir de 2008, desde que o país conquistou o terrível
título de campeão mundial no uso de agrotóxicos. Mas é fato que há ainda muita
dificuldade de se discutir o enfrentamento dessa questão, sobretudo com o
governo e os órgãos que deveriam fazer o trabalho de fiscalização e controle. O
país vem investindo de maneira estratégica neste modelo de agricultura
produtora de commodities para exportação; há interesses muito grandes
envolvidos aí. E há consequentemente uma reação muito forte capitaneada,
sobretudo, pela bancada ruralista, que busca bloquear qualquer tipo mudança que
implique em restrições ao uso dos venenos.
Além
disso, há muita falta de informação por parte da população e mesmo dos
agricultores. Este assunto é também por muitos considerado demasiado técnico,
difícil. Daí a enorme importância da divulgação e popularização do conhecimento
a esse respeito.
Justamente
buscando contribuir para a superação desta dificuldade é que acabamos de lançar
o livro Agrotóxicos no Brasil – um guia para ação em defesa da vida, uma
iniciativa da Articulação Nacional de Agroecologia – ANA e da Rede Brasileira
de Justiça Ambiental – RBJA. Trata-se de um material de consulta, em que o
leitor encontrará informações relevantes sobre a legislação de agrotóxicos –
para com elas mobilizar ações no sentido de exigir seu cumprimento; sobre os
programas de monitoramento de resíduos de venenos nos alimentos – para cobrar a
sua expansão e aperfeiçoamento e assim promover o acesso a alimentos menos
contaminados; sobre como identificar, encaminhar, notificar e prevenir casos de
intoxicação – e com isso melhorar o apoio às populações sujeitas aos riscos dos
efeitos dos venenos sobre a saúde; e sobre os processos de reavaliação
toxicológica dos agrotóxicos autorizados no Brasil – para então organizar o
apoio à luta pelo banimento de produtos perigosos. A publicação traz também
casos reais de intoxicação e de contaminação ambiental, bem como apresenta, ao
final, caminhos para a articulação e a mobilização das pessoas e organizações
que não se conformam em aceitar passivamente o envenenamento massivo dos
campos, das cidades, da água, do ar e das pessoas.
Fonte: IHU On-Line/EcoAgência
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